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Contextualizando a Abordagem de Análise de Redes Sociais

Recentemente são cada vez mais abundantes as evidências de que a humanidade está caminhando para a consolidação de um processo de estruturação em forma de rede. As descobertas e os avanços tecnológicos no campo da informação e comunicação, particularmente as tecnologias de transmissão de dados e a formação da world wide web, tornaram o globo um local virtualmente pequeno. Via satélite ou pela internet, pessoas dos lugares mais diversos podem ter conhecimento do que se passa ao redor do globo. Não apenas isto, podem ainda estabelecer relações motivadas por uma pluralidade de interesses, e formar grupos e comunidades com diferentes finalidades e formatos.

Este movimento de integração ocorre em praticamente todos os campos da vida humana, na economia, política, cultura, meio ambiente, entre outros, com conseqüências para as nações, as sociedades e os indivíduos. Na em medida que a interatividade global é ampliada e intensificada, fatos que anteriormente teriam repercussão noticiosa ou reflexos concretos sobre um grupo limitado de pessoas circunscritas a uma região específica, neste momento atual podem adquirir dimensões globais. Este aspecto da sociedade contemporânea não ocorre apenas em uma escala internacional, também a nível local pode-se observar um crescente processo de incremento das interações entre indivíduos e entre instituições, aprofundando a interdependência entre eles. Os fenômenos descritos podem ser caracterizados como pertencentes a uma lógica de rede. Não apenas de uma única rede de âmbito global, mas várias redes globais, regionais e locais. Como se formam estas redes? Como elas funcionam? Elas conseguem atingir seus propósitos? São algumas questões relacionadas a estes fenômenos que tem despertando o interesse de um progressivo número de estudiosos dedicados à análise de redes.

A concepção de que os indivíduos, os acontecimentos e os meios pelos quais eles se manifestam, estão todos relacionados em uma escala que extrapola os limites do cotidiano pessoal, é uma idéia recorrente ao longo da história. Desde a antiguidade clássica ocidental, diferentes pensadores cogitaram que a vida na terra possuía um determinado grau de interação capaz de produzir uma interdependência entre diferentes pessoas e fatos, para descrever este conceito empregavam o termo “teia da vida” (CAPRA, 2008, 18). Por muitos séculos este pensamento esteve circunscrito à esfera teórica, pois não havia meios empíricos que comprovassem ou não sua veracidade, mesmo que em parte. O desenvolvimento de novas técnicas científicas, sobretudo no século passado, proporcionou a evidência dos primeiros elementos concretos de uma relação íntima entre os seres. Na década de 1920 ecologistas ao analisar os hábitos alimentares de diferentes espécies de animais identificaram que estes seres estavam ligados de tal forma por uma cadeia alimentar que o ecossistema onde habitavam poderia ser descrito como uma rede contínua de “trajetos metabólicos através de organismos”(idem).

A consolidação do estudo das relações entre os seres vivos pelos estudiosos das ciências naturais gerou elementos para a formulação da teoria dos sistemas pelo biólogo austríaco Ludwig Von Bertanlaffy nos anos 1950 e 60. Para ele os estudos científicos mesmo que desenvolvidos individualmente, ou separados por áreas de conhecimento (biologia, física, química, sociologia, etc.) tinham de ser entendidos dentro de uma perspectiva relacional, sendo que a natureza não se dividia claramente em diferentes partes e as teorias desenvolvidas por algumas áreas teriam validade para outras (BERTANLAFFY, 1977). Em concordância com o que defendia Bertanlaffy, não tardou para que outras ciências formulassem teorias semelhantes e as utilizassem em seus estudos. Paralelamente à teoria desenvolvida por ele e possivelmente sem a influência de suas idéias, o pesquisador americano Jay Wright Forrester elaborou uma teoria sobre a dinâmica de sistemas, para a aplicação no gerenciamento de dados e informações (KURTZ DOS SANTOS, 2008), ela foi adaptada posteriormente para a área da Administração e da Economia, sua tese forneceu as bases para o desenvolvimento de uma abordagem sistêmica dos diferentes elementos ligados a estas áreas. No campo das ciências sociais os estudos pioneiros foram desenvolvidos pela sociologia, psicologia social e a antropologia, sendo o antropólogo britânico John A. Barnes o responsável em 1954 pela concepção do termo “rede social” (social network) (WASSERMAN; FAUST, 1997, p. 7).

O conhecimento produzido até a década de 1960 proporcionava uma concepção teórica da análise de sistemas relacionais, sendo possível em algumas ciências a verificação empírica de casos determinados. Na década seguinte uma transformação paradigmática teve início na área tecnológica e os reflexos que ela produziu sobre a sociedade global curiosamente eram ajustáveis ao que pensadores e pesquisadores de teorias relacionais haviam concebido anteriormente. Naquele momento o desenvolvimento tecnológico e econômico das principais nações do globo impulsionava uma crescente troca de informações, mercadorias e capitais, sem paralelos na história humana. A intensidade e a proporção desta transformação geravam impactos sobre o comportamento dos indivíduos e da sociedade em geral, novas formas de agir e pensar que também repercutiam sobre o campo tecnológico e econômico, retroalimentando o processo de transformação global, incentivando novas práticas e possibilitando outras descobertas. Segundo o sociólogo espanhol Manuel Castells (2008), a matéria-prima deste momento de inflexão vivido pela humanidade é a informação, é por meio dela e das inovações a ela atreladas que é possível esboçar algumas características deste evento.

Primeiramente, parte considerável das novas tecnologias é desenvolvida para agir sobre a informação, sendo ela intimamente associada ao cotidiano humano, a penetrabilidade das novas tecnologias geram efeitos profundos no comportamento dos indivíduos. Os novos recursos informacionais permitem um incremento da interação entre os indivíduos, de modo que surjam arranjos diversos segundo uma lógica de redes, uma ampla gama de relações que se estabelecem em todos os tipos de processos e organizações. As duas últimas características são derivadas desta terceira, as redes possuem um alto grau de flexibilidade, e as novas descobertas tecnológicas tendem a gerar uma convergência de tecnologias específicas para a formação de um sistema altamente integrado (CASTELLS, 2008, p. 108s). A convergência das novas tecnologias de informação gera um efeito de interdependência entre diferentes segmentos de um campo e mesmo entre setores de áreas diferentes. Atualmente a análise de redes é utilizada para o estudo de diferentes áreas do conhecimento, como a telecomunicação, a biomedicina, a sociologia e a ciência política, entre outros. Ela consiste em um importante instrumento para a análise de diversos fenômenos, por meio dela é possível realizar uma abordagem estrutural e assim poder elaborar explicações do que está sendo analisado (MARTELETO, 2001, p. 72).

Referências

CAPRA, Fritjof. Vivendo redes. In: DUARTE, Fábio; QUANDT, Carlos Olavo; SOUZA, Q. (Orgs.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, p. 17-29, 2008.

BERTANLAFFY, Ludwig Von. Teoria geral dos sistemas. 2ª Ed.. Petrópolis: Vozes, 1975.

KURTZ DOS SANTOS, A. C. Algumas idéias sobre sistemas. Capítulo de livro. Disponível em: http://www.fisica.furg.br/arion/livrostel/02sistem.htm. Acesso em: 27 de novembro de 2008.

WASSERMAN, Stanley.; FAUST, Katherine. Social Network Analysis in the Social and Behavioral Sciences. In: WASSERMAN, S.; FAUST, K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press,1997.

CASTELLS, Manuel. A Era da Informação: economia, sociedade, cultura. A sociedade em rede. Volume I, 6ª Ed.. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2008.

MARTELETO, R. M.. Análise de redes sociais: aplicação nos estudos de transferência da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 30, n. 1, p. 71-81, 2001.

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