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Ciência, Política e Maquiavel

Há várias formas de se atingir o conhecimento, a mais antiga e também mais usual é a que se fundamenta por meio da experiência ou vivência pessoal, que se expressa através do “senso comum” uma espécie de entendimento coletivo e superficial do mundo, que é repassado às sucessivas gerações pela tradição e cultura de uma sociedade. Apesar de ser a forma mais utilizada pelos indivíduos para conhecerem a realidade que os cerca, ele contém limitações. Por não se tratar de um processo organizado e racional de conhecimento, o “senso comum” não se constitui um método para se estudar a natureza das coisas. Há ainda outras formas de conhecimento que se condensam e geram uma organização, como a arte, a literatura, a religião, entre outras, que também geram saber, mas somente em alguns casos se constituem como uma ciência. Isto porque a ciência busca organizar o estudo empírico para se chegar ao conhecimento da realidade, ela permite uma relação técnica com a natureza, possibilitando ao homem entender e comprovar os fenômenos naturais e fatos societais, capacitando-o a interagir com estes e em certa medida controlá-los. A ciência caracteriza-se por ser um processo objetivo de conhecimento, com um método próprio, pautado pela observação, investigação, experimentação e comprovação e uma linguagem própria, a técnica. Na história da humanidade, a gênese da ciência moderna coincidiu com o fim de quase um milênio de obscurantismo da idade média e o advento da Renascença nos séculos XIV e XV, nos centenários seguintes muitas áreas do conhecimento progrediram e alcançaram o status de ciência, como a física, a química, a economia, a sociologia, entre outras. No século XX o estudo científico se diversificou intensamente, surgiram muitos outros setores de pesquisa, que passaram a contemplar praticamente a totalidade dos fenômenos e fatos da realidade. Ao passo que surgiam novas vertentes do estudo científico, aumentava também a necessidade de dedicação exclusiva a cada ciência. Os estudiosos na Renascença detinham pleno conhecimento em várias áreas, no século passado este perfil se modificara, devido a sucessivos e profusos avanços os cientistas passaram a se especializar em uma determinada área, buscando dominar sua teoria e técnica, a fim de sempre estar a ratificar ou retificar suas conclusões. Por fim,o homem da ciência precisa evitar os “juízos de valor” e limitar-se em desvendar os mistérios da natureza, pois pode comprometer a objetividade de seu trabalho se este estiver permeado por posições políticas e ideológicas. Como escreve Max Weber “sempre que um homem de ciência permite que se manifestem seus próprios juízos de valor, ele perde a compreensão integral dos fatos” (WEBER, 2002, p. 47). O termo política surgiu na Grécia Antiga derivado do adjetivo originado de pólis (polítikós), que significa o que se refere à cidade e, conseqüentemente, o que é urbano, civil, público, e até mesmo sociável e social (BOBBIO & MATTEUCCI, 1998, p. 954). Para entender seu significado, não basta conhecer a etimologia da palavra é mister compreender o valor que a comunidade dava à política. Na Antigüidade Clássica grega ela referia-se à vida pública existente na Ágora, as relações sociais que eram estabelecidas em seu seio e ao discurso corrente naquela sociedade. Em geral, estava em discussão decisões a respeito do destino da cidade e dos cidadãos, por envolver aspectos decisionais a política está intimamente ligada às deliberações a cerca de uma forma de poder, de quem o detém, a quem se aplica, como ele é exercido. Neste sentido a política pode ser identificada não apenas na sociedade grega, mas também em outras, sejam elas mais primitivas ou mais avançadas, pois seus elementos podem ser identificados em vários aspectos da vida humana, como a vida em sociedade, a família, a religião, o trabalho e o comércio. Esta relação que a política possui com o poder, se verifica de modo mais claro e sistemático por meio do Estado, entendido como uma forma de organizar o poder dentro de uma sociedade, não obstante o posterior conceito de “Estado Nacional” a que se agrega as concepções de território e cultura, o Estado se torna a partir do Renascimento o lócus privilegiado de estudo da política e do poder. Dentro desta análise outras discussões adquirem relevância, como a finalidade do poder político, o domínio e uso da força/coação e a relação amigo/inimigo. Na tradição clássica os conceitos de política e Estado possuem a mesma extensão, mas ao incorporar novos elementos, a categoria de política é hoje mais abrangente que a de Estado, porém ainda menos ampla que a esfera social. Durante séculos, a chamada ciência política não foi uma “ciência” no sentido moderno da palavra, mas uma “arte do governo” voltada para os governantes que consistia em preceitos sobre o melhor modo de conquistar e manter o poder (BOBBIO, 2000, p. 390). Apesar de muitos pensadores antes de Maquiavel terem escrito sobre a política, ele é comumente intitulado o precursor da ciência política porque no seu célebre livro “O Príncipe” utilizou uma abordagem realista da questão, diferenciando-se de antecessores como Aristóteles que empregavam uma concepção idealista, e também de seus contemporâneos como Thomas Morus que elaborou o conceito de utopia. Maquiavel havia sido um alto funcionário do governo republicano da cidade de Florença, norte da atual Itália, de 1498 a 1512, e utilizou a experiência concreta no trato da coisa pública, a observação apurada do processo político e o estudo da história, para formular sua teoria própria da arte de governar e lançar as bases da ciência política moderna. Em “O Príncipe”, Maquiavel identifica e discorre sobre aspectos da práxis política que doravante seriam longamente discutidos e utilizados. Entre outras questões pondera que o governante necessita contar com a virtude (virtú), a sorte (fortuna) e a oportunidade (occasione) para ter um bom desempenho. Analisa as formas de governo (república e principados – hereditários ou adquiridos), o domínio e o uso da força, questões que seriam fundamentais para estabelecer suas propostas de como se atingir e manter o poder. Desta forma, ele iniciava o estudo dos fenômenos políticos tendo como base uma metodologia que posteriormente viria a constituir a ciência política moderna. Referências BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola. Dicionário de Política. Brasília: UNB, 1998. BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política. Rio de Janeiro: Campus, 2000.
WEBER, Max. Ciência e Política: duas vocações. São Paulo: Editora Martin Claret. 2002.

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