O
neoinstitucionalismo da escolha racional identificado por Hall e Taylor (2003)
surgiu no final da década de 1970, impulsionado pela limitação da teoria
clássica da escolha racional em explicar a estabilidade existente nas decisões
do Congresso Norte-Americano, apesar da diversidade de preferências dos
congressistas e a complexidade das questões por eles abordadas, a alternativa
estaria em buscar explicar este paradoxo por meio das instituições (p. 202). No
novo institucionalismo da escolha racional a estrutura institucional adquire um
caráter utilitarista, as instituições seriam construídas racionalmente pelos
indivíduos, de modo que seus interesses pessoais possam ser realizados
(CARVALHO; VIEIRA; LOPES,1999, p. 04).
Dentro desta
corrente institucional há uma considerável diversidade de tendências de
análise, que incorpora desde elementos da “nova economia da organização[1]” ao modelo da teoria dos
jogos; no entanto é possível identificar quatro aspectos comuns à maioria delas
(HALL; TAYLOR,
2003, p. 205). Inicialmente, a maior parte dos teóricos da escolha racional considera
que os atores podem possuir preferências convergentes, e que para aumentar os
ganhos que elas possam proporcionar, agem de forma utilitária, recorrendo a uma
estratégia que envolve diferentes cálculos racionais. Em segundo lugar,
compreendem que a vida política dos atores é composta por uma sucessão de
dilemas que envolvem a coletividade. Neste processo os indivíduos
privilegiariam as opções que otimizassem seus ganhos, mesmo que isto
representasse um prejuízo para outras pessoas. Isto seria potencializado por um
contexto institucional frágil (em que impere a ausência de valores, por
exemplo), que não iniba a ação egoísta que acarreta o dano no plano coletivo.
O
terceiro ponto comum evidencia o “papel da interação estratégica na
determinação de situações políticas”, o indivíduo agiria fortemente motivado
pelo comportamento que ele espera que os outros atores tenham. Às instituições
cabe estruturar esta interação fornecendo as possibilidades de escolha, as informações
e os mecanismos que poderão ser adotados. A última característica compartilhada
pela maioria dos teóricos da escolha racional no neoinstitucionalismo é quanto
ao processo de criação das instituições (HALL; TAYLOR, 2003, p. 206). Elas seriam fruto do valor dado às suas funções
pelos atores que as influenciam. As instituições seriam criadas pelos atores
para que elas realizassem aquilo que delas se espera, o que para os teóricos
desta corrente é possível mediante a cooperação voluntária entre os indivíduos
envolvidos.
Estes
pressupostos da teoria da escolha racional fornecem um conjunto distinto de
abordagens para o estudo das instituições, que contribuem para o entendimento
de três questões: os efeitos das instituições, porque elas são
importantes para todos e porque escolhemos pessoalmente algumas delas em
particular e a importância disto para a sobrevivência em longo prazo das
instituições. O exame institucional por meio do enfoque da escolha racional
ocorre basicamente em dois níveis de análise, um verifica os efeitos das
instituições sobre os indivíduos, e o outro, porque as instituições assumem
formas particulares de organização e funcionamento. No primeiro caso é
realizado um estudo externo das instituições e no segundo há uma preocupação em
conhecer suas características internas. (WEINGAST, 2002, p. 660).
Em uma
perspectiva semelhante, entende-se que atualmente há duas maneiras para se
pensar as instituições. A primeira considera que elas são fatores externos que
constrangem a decisão e a ação dos indivíduos, a instituição neste caso
propiciaria à pessoa uma seleção de opções, de modo que ela possa montar a
estratégia que considere mais oportuna para se chegar ao seu objetivo (SHEPSLE, 2008, p. 24). No
que concerne ao papel que as instituições exercem sobre os atores na definição
de sua conduta, a abordagem da escola da escolha racional foge da linha
tradicional que atribui todas as decisões do indivíduo às suas motivações
pessoais e passa a considerar elementos do meio onde ele está inserido. Neste
sentido as instituições figuram como o principal fator de influência, seriam
elas o meio pelo qual se estruturam as estratégias dos indivíduos, e nesta
perspectiva, conteriam elementos que regulam sua ação (CARVALHO,
2008, p. 215).
Este primeiro aspecto é uma
derivação da “teoria dos custos de transação”, que entre outros elementos,
considera para que haja negociações eficientes internamente e externamente a
uma empresa, é necessário existir um arcabouço contratual que oriente estas
formas de interação. Este
arcabouço contratual das instituições, não apenas fornece elementos para
subsidiar as decisões dos indivíduos, ele também acaba influenciando seu
processo de decisão pessoal, as instituições
forneceriam as informações (normas e arranjos formais e informais) a partir das
quais os atores formulariam suas estratégias de ação. Nas palavras de
Bruno S. Carvalho, “as instituições condicionam as orientações individuais e
tornam os comportamentos contingentes ao contexto em que estão inseridos”
(Idem, 217)[2].
Uma segunda
forma de compreender o papel das instituições na teoria da escolha racional, consiste em que ela não as vê como construções externas e dissociadas dos
indivíduos, mas como algo construído por eles próprios. Neste caso, a
pessoa não se submete às regras do jogo, aos condicionamentos impostos por
instituições já existentes, mas ela própria participa da elaboração das regras
e da formação das instituições (SHEPSLE, 2008, p. 25). Nesta
perspectiva, as instituições refletem a vontade das pessoas de se envolverem
umas com as outras, de acordo com certos padrões e processos, o que acabaria
por induzir à coordenação e ao equilíbrio no modo de se fazer as coisas.
As questões
abordadas pela escola da escolha racional são importantes não apenas para a
análise das instituições, mas também para o estudo de problemas políticos e
sociais e os impactos gerados pelas instituições políticas. Um viés importante neste campo
de estudo e que a escola da escolha racional ajuda a compreender, é o da
política comparada. Na medida em que torna possível o conhecimento de como se
estruturam as estratégias individuais e como elas influenciam o modo de atuar,
e mesmo de se organizar, das instituições envolvidas no quadro comparativo, a
teoria da escolha racional traz uma importante contribuição para o campo
político. Além disso, esta escola também fornece uma variedade de
mecanismos que propiciam as previsões de mudança contínua, o que também auxilia
na análise de questões políticas, dado o dinamismo com que ocorrem modificações
conjunturais nesta área (WEINGAST, 2002, p. 691s).
Apesar da
escola da escolha racional contribuir para o entendimento do processo decisório
individual e para a análise das instituições políticas e sociais, esta corrente
de pensamento possui limitações, principalmente por não contemplar a influência
que fatores externos aos indivíduos possam ter para a sua tomada de decisão e o
reflexo deste fator sobre a constituição e funcionamento das instituições (CARVALHO,
2008, p. 159). Este fator
em particular é o que principalmente diferencia a teoria institucional da
escolha racional das duas outras principais correntes institucionalistas, a
histórica e a sociológica. No entanto, entre os pensadores da rational choice sempre houve esforços para
enfrentar estas diferenças e as críticas que surgiam.
Faz parte
deste processo a teoria de racionalidade limitada, que considera que os
indivíduos não agem apenas com base na razão, mas também são influenciados por
outros fatores, como suas aspirações e desejos de satisfação, a partir deste
abrandamento dos fundamentos da teoria da escolha racional, outros segmentos de
pensamento surgiram dentro da corrente. Como o da “economia comportamental”,
que considera que os indivíduos sofrem restrições cognitivas em virtude de
razões psicológicas; a da “transação custo-economia” centrada no
estabelecimento de contratos, cuja ênfase passa a ser a busca para torná-lo
mais vantajoso, mediante a escolha de bons parceiros, antecipação de
contingências, controle de seu cumprimento, etc.; e ainda, a “narrativa
analítica”, aplicado em estudos de caso levando-se em consideração o
desenvolvimento institucional dentro de certo contexto histórico (SHEPSLE, 2008, p. 32-35).
Apesar de
estas concepções abrirem um pouco mais as perspectivas do campo de estudo da
teoria da escolha racional, de modo geral, esta escola adota uma visão restrita
das influências exercidas sobre o indivíduo, tendo em vista o caráter subjetivo
do cálculo racional por ele empregado para atingir seus objetivos. As
influências estariam circunscritas primeiramente às instituições, que seriam
responsáveis por fornecer os elementos estruturais utilizados na sua estratégia
de maximização de ganhos, e na interação do indivíduo com outros atores, na
medida em que estes também podem servir a seus propósitos.
REFERÊNCIAS
HALL, Peter; TAYLOR, Rosemary C. R. As três versões do neoinstitucionalismo.
Lua Nova. N. 58, p. 193-224, 2003.
SHEPSLE,
Kenneth A.. Rational Choice Institutionalism. In: RHODES, BINDER & ROCKMAN.
The Oxford Handbook of Political
Institutions. Great
Bretain: Oxford University Press, p. 23-37. 2008.
WEINGAST, Barry R. Rational-Choice Institutionalism. In Katznelson, Ira & Milner, Helen V. (Eds). Political
Science:
State of the Discipline. New York: W.W. Norton, p. 660-692, 2002.
CARVALHO, Bruno S.. A Escolha Racional como Teoria Social e Política: Uma Interpretação
Crítica. 1. Ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2008.
CARVALHO, Cristina
Amélia; VIEIRA, Marcelo Milano Falcão; LOPES, Fernando Dias. Contribuições da
perspectiva institucional para análise das organizações. In: XXIII Encontro
Nacional de Programas de Pós-Graduação em Administração, 1999, Foz do Iguaçu. Anais do XXIII EnANPAD. Porto Alegre :
ANPAD, v. 1. p. 1-15, 1999.
[1] Caracterizada pela importância dada ao
direito de propriedade, das rendas e dos custos de transação para o
desenvolvimento e o funcionamento das instituições (HALL;
TAYLOR, 2003, p. 203).
[2] A incorporação de elementos externos ao processo de
decisão individual, por mais que se aproxime da abordagem do novo
institucionalismo histórico e sociológico, é feita dentro da perspectiva de
análise da escola da escolha racional, as duas outras correntes, bem como suas
diferenças e semelhanças são abordadas mais adiante nesta seção.
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