Pesquise no Blog

Neoinstitucionalismo Sociológico

Resultado de imagem para cultura do jeitinho brasileiro
IlustraçãoFelipe Mayerle
O desenvolvimento da abordagem institucional para a explicação de fenômenos e organizações da arena público-política, não ocorreu exclusivamente no campo da ciência política, no mesmo momento em que se aprofundavam os estudos nesta área do conhecimento, também se desenvolvia na sociologia teorias que concebiam uma nova perspectiva institucionalista que se contrapunha à visão sociológica clássica das organizações (HALL; TAYLOR, 2003, p. 207). Este enfoque tradicional entendia as instituições como um produto da estruturação formal da sociedade, de modo que fosse possível cumprir com racionalidade e eficiência as tarefas inerentes a elas. Dissociando-se desta perspectiva, a partir da década de 1970, diferentes sociólogos passaram a tratar a abordagem institucional no seu campo de estudo a partir de um novo elemento, a cultura[1].
Estes pensadores estavam interessados em conhecer os efeitos que os preceitos culturais, os valores, os rituais, as cerimônias e as superestruturas possuíam para e sobre as organizações. Em comum com a visão clássica, os sociólogos neoinstitucionalistas também nutrem um ceticismo em relação à escola da escolha racional e sua concepção de institucionalização, que concebe organizações menos propensas à racionalidade instrumental e mais condicionantes das opções que os indivíduos possuem, determinando as regras e normas que estes devem seguir (DIMAGGIO; POWELL. 1997, p. 126). Na nova visão institucional da sociologia, o aspecto central é a interação entre as organizações e o ambiente em que estão inseridas, enfatizando o papel que a cultura possui para a formação da realidade organizacional.
Neste sentido, o neoinstitucionalismo sociológico entende que os elementos da ação racional, como os atores, os interesses e as preferências, são socialmente construídos; a investigação então é centrada nas “instituições informais”, em geral, tudo que é um dado adquirido do ambiente (NIELSEN, 2001). Portanto, as formas e os procedimentos utilizados pelas organizações modernas, não seriam fruto de uma razão voltada para a eficiência ou mesmo para os ganhos individuais que delas viriam, mas antes constituiriam práticas culturais que são incorporadas por estas estruturas organizacionais, mediante um processo de transmissão, semelhante ao que ocorre com as práticas culturais em geral. Tal pressuposto serviria para explicar as semelhanças existentes na forma e nos procedimentos institucionais, entre organizações de mesmo perfil, mas de diferentes lugares pelo mundo. (HALL; TAYLOR, 2003, p. 208).
Esta abordagem culturalista se reflete também na concepção que os neoinstitucionalistas sociológicos possuem sobre as instituições, ao incorporarem elementos cognitivos e comportamentais ao estudo das organizações, as percepções que os indivíduos possuem do ambiente e a interpretação que constroem do que é real são fundamentais para o processo de institucionalização. Consideram que instituições são modelos construídos de forma subjetiva pelos indivíduos e sua coletividade, e desta forma, os valores, as crenças, os símbolos são considerados instituições, influenciando as ações humanas, mesmo dentro das organizações (CARVALHO; VIEIRA; LOPES,1999, p. 09; NASCIMENTO, 2009, p. 103).
Este novo entendimento do que pode representar uma instituição possui pelos menos duas implicações que merecem ser consideradas. Primeiramente ela contraria a oposição teórica entre “instituição”, entendida como regras e normas estabelecidas por uma estrutura organizacional, e “cultura”, vista como “um conjunto de atitudes, de valores e de abordagens comuns face aos problemas”. A nova abordagem proposta pelos sociólogos institucionais formula ainda uma nova explicação para o que pode significar cultura, que passa a ser considerada também como instituição (HALL; TAYLOR, 2003, p. 209). As formas cognitivas predominantes que representam a cultura deixam de ser os valores, as normas e as atitudes, e passam a ser elementos do ambiente em que estão inseridos os indivíduos; nesta perspectiva, as instituições ao invés de apenas gerarem compromissos emocionais e morais, são entendidas elas próprias como macro-abstrações, os cenários, as regras e as classificações que influem no comportamento das pessoas dentro uma organização (DIMAGGIO; POWELL. 1997, p. 130).
Esta mudança no entendimento do que são instituições, permite que os teóricos do neoinstitucionalismo sociológico tenham uma visão diferente da interação entre as instituições e ação dos indivíduos, das que possuem os pensadores de outras correntes do estudo institucional. Ao considerar que as instituições fornecem símbolos, cenários e arquétipos mentais, elas influenciariam a forma de agir e as preferências individuais (HALL; TAYLOR, 2003, p. 209). O enfoque neste caso recai sobre o impacto que a cultura e seus efeitos cognitivos possuem para o comportamento do indivíduo. Em seu cotidiano as pessoas são submetidas a uma massa exorbitante de dados sensoriais; reagir a ela por meio de um cálculo racional e consciente seria, para a sociologia institucionalista, uma tarefa deveras extenuante, senão impossível. Os institucionalistas sociológicos postulam que as pessoas tendem a recorrer a mecanismos que as ajudem a decidir e a atuar, no processo de solução das situações cotidianas; para estes pensadores os modelos oferecidos no ambiente institucional cumpririam esta função (Idem, p. 210). Os indivíduos se utilizariam de uma racionalidade prática, buscando no seu conjunto de conhecimentos tácitos e tipificações cognitivas oriundas de sua interação com as instituições, a forma mais adequada para interpretar uma situação e agir em acordo com ela (DIMAGGIO; POWELL. 1997, p. 138).
Um terceiro e último aspecto a salientar como uma característica própria da escola sociológica ante as demais, no estudo das instituições, são as práticas institucionais, como elas surgem e se modificam. Nesta corrente de pensamento, o desenvolvimento das mudanças dentro de uma organização é motivado por uma necessidade de fortalecer sua legitimidade e a de seus membros, diante da sociedade (HALL; TAYLOR, 2003, p. 211).  Diferente do que ocorre com a escola da escolha racional, que compreende que as transformações institucionais são realizadas visando à eficácia que os arranjos organizacionais podem proporcionar às pessoas neles envolvidas, o institucionalismo sociológico “tende a ver a mudança institucional em termos de uma relação de convergência entre as instituições e o cenário histórico-social” (NASCIMENTO, 2009, p. 109).
Neste debate sobre as mudanças institucionais visando uma maior legitimidade social, a questão central que se apresenta é o isomorfismo, ou seja, como organizações de um mesmo campo de atuação, acabam possuindo uma estrutura formal semelhante. Paul Dimaggio e Walter Powell argumentam que as transformações isomórficas em uma organização ocorrem principalmente a partir de três mecanismos: o coercitivo, o mimético e o normativo (CARVALHO; VIEIRA; LOPES, 1999, p. 10; NASCIMENTO, 2009, p. 109, HALL; TAYLOR, 2003, p. 212). No caso em que a coerção é a principal razão da mudança, a transformação ocorre em função de pressões externas, que podem ser exercidas pela autoridade do Estado, por organizações mais fortes ou por pressão do conjunto da sociedade. O mecanismo do tipo mimético ocorre quando uma organização visa adaptar-se ao seu campo específico. Estas mudanças se sucedem, por exemplo, em virtude da necessidade de atualizar-se tecnologicamente, para adotar práticas já consagradas em outras organizações ou para fazerem frente à sua concorrência. Já a mudança ocasionada por um mecanismo normativo, é a que ocorre quando há uma homogeneidade de práticas e formas de interpretação dentro de um dado campo organizacional, frente aos desafios e problemas que colocam em risco sua autonomia; faz parte deste processo normativo o papel que desempenha o corpo de profissionais e sua autoridade cultural para ditar as normas e práticas a toda a área do conhecimento a que pertencem.
Resumindo, o neoinstitucionalismo sociológico ao considerar elementos culturais (como os símbolos e os hábitos) como formas institucionais, possui um entendimento mais amplo do que significa instituição, daquele que é defendido, por exemplo, pelos teóricos da escolha racional. Em segundo lugar, esta abordagem redefine o próprio significado do que é cultura, que passa a ser considerada como um sinônimo de instituição. Por fim, os sociólogos institucionais buscam na dimensão cultural e no ambiente que a compõe, a explicação para as mudanças institucionais.


REFERÊNCIAS

CARVALHO, Bruno S.. A Escolha Racional como Teoria Social e Política: Uma Interpretação Crítica. 1. Ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2008.

CARVALHO, Cristina Amélia; VIEIRA, Marcelo Milano Falcão; LOPES, Fernando Dias. Contribuições da perspectiva institucional para análise das organizações. In: XXIII Encontro Nacional de Programas de Pós-Graduação em Administração, 1999, Foz do Iguaçu. Anais do XXIII EnANPAD. Porto Alegre : ANPAD, v. 1. p. 1-15, 1999.

DIMAGGIO, P. e POWELL, W. (1997). Le néo-institutionnalisme dans lanalyse des organisations, Politix, n. 40. p. 113-154. 1997. Disponível em: http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/revue/polix. Acesso em: 20 de março de 2010.

HALL, Peter; TAYLOR, Rosemary C. R. As três versões do neoinstitucionalismo. Lua Nova. N. 58, p. 193-224, 2003.

NASCIMENTO, Emerson Oliveira. Os Novos Institucionalismos na Ciência Política Contemporânea e os Problemas da Integração Teórica. Brasília, Revista Brasileira de Ciência Política, v. 01, p. 95-121, 2009.

NILSEN, Klaus. Institutionalist Approaches in the Social Sciences: Typology, Dialogue, and Future Challenges. In: Journal of Economic Issues. Vol. 35, nº 3, junho de 2001. Disponível em: . Acesso em: 20 de março de 2010.





[1] Os principais textos desta fase inicial do neoinstitucionalismo sociológico são: "The Effects of Education as an Institution" de John Meyer, e "Institutionalized Organizations: Formal Structure as Myth and Ceremony” de John Meyer e Brian Rowan, ambos de 1977. (DIMAGGIO; POWELL. 1997, p. 126).

Nenhum comentário: