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Neoinstitucionalismo Histórico


Na trajetória dos estudos políticos a abordagem histórica não é algo recente, desde que Maquiavel escreveu seu clássico livro “O Príncipe”, muitos pensadores realizaram seus estudos recorrendo à história para elaborarem suas argumentações, alguns exemplos disto podem ser encontrados na obra de Max Weber, Alexis de Tocqueville, John Locke, e mais recentemente, Maurice Duverger. Porém, com a ascensão do behaviorismo depois da Segunda Guerra Mundial e o desenvolvimento de novas tecnologias computacionais que permitem o processamento de uma grande gama de dados estatísticos, o uso da abordagem histórica nos estudos políticos se tornou incipiente, sendo retomada somente em meados da década de 1970 em diante, com uma perspectiva mais analítica e epistemológica (SANDERS, 2008, p. 40). 

Apesar das diferentes perspectivas de estudo na ciência política, e das críticas que foram formuladas a ela, a abordagem histórica é um método reconhecido de análise de fenômenos políticos e sociais e possui valor para o desenvolvimento desta ciência. O neoinstitucionalismo histórico recorre a questões de fundo e a um amplo recorte temporal para desenvolver argumentos que possam explicar os resultados das relações políticas, também utilizam recortes temporais para que possam especificar sequências e rastrear transformações e processos de escala variável; ao invés de estudar individualmente uma instituição ou um processo, os institucionalistas históricos analisam hipóteses sobre os efeitos combinados de instituições e processos, em uma perspectiva de “macro contextos” (PIERSON; SKOCPOL, 2002, p. 695). 

Utilizando esta perspectiva de análise, os teóricos do institucionalismo histórico consideram que as ações coletivas e seus resultados são influenciados pela organização das instituições sociais, políticas e econômicas de uma dada sociedade, e não que elas sejam resultado das disputas entre os grupos de indivíduos. Esta corrente compreende como instituição “os procedimentos, protocolos, normas e convenções oficiais e oficiosas inerentes à estrutura organizacional de uma comunidade política ou da economia política” (HALL; TAYLOR, 2003, p. 196). Semelhante aos praticantes da escola da escolha racional, os institucionalistas históricos consideram que as instituições constituem restrições que influenciam a forma com que as pessoas interagem. 

 Porém, os defensores destas duas correntes de pensamento diferenciam-se quanto à forma como utilizam esta abordagem. A teoria da escolha racional foca seus estudos nos indivíduos, explorando a forma como eles interagem com as instituições buscando o melhor rendimento para as suas preferências dentro de um cenário de restrições institucionais estáveis. Por outro lado, na abordagem institucional histórica o foco recai sobre as motivações humanas para que sejam atingidas metas, sua evolução no longo prazo, e nos resultados derivados da relação dentro do conjunto dos atores de uma organização, bem como, entre eles e seus competidores externos (SANDERS, 2008, p. 42). A partir desta abordagem, uma questão importante se apresenta, como as instituições impactam no comportamento dos indivíduos? O institucionalismo histórico oferece duas perspectivas analíticas para esta questão, o viés “calculador” e o “cultural”. 

 Os defensores da perspectiva calculadora consideram que o comportamento humano é instrumentalizado e orientado para um cálculo estratégico, e para que isto ocorra satisfatoriamente, as instituições forneceriam um grau elevado de previsibilidade para as ações presentes e futuras de outros atores. Esta concepção de como as instituições influenciam o comportamento dos indivíduos seria responsável ainda pela sua subsistência, sendo que os atores acabam obtendo mais ganhos aderindo aos modelos de comportamento propagado por uma instituição, do que os evitando. Com mais pessoas concordando com as práticas comportamentais de uma determinada estrutura institucional, mais forte ela tende a ser (HALL; TAYLOR, 2003, p. 197s). Mais uma vez aqui, parte dos historiadores institucionais se aproxima dos partidários da escolha racional; de fato, as teorias não precisam ser vistas como uma antítese uma da outra, mas precisam ser encaradas como complementares. Elas acabam por possuir diferenças de enfoque, o que pode variar de acordo com a metodologia e a formação intelectual de cada pesquisador (SANDERS, 2008, p. 43; PIERSON; SKOCPOL, 2002, p. 698). 

 No que tange o viés cultural para a análise do impacto que as instituições possuem na vida dos indivíduos, o comportamento individual motivado pela razão e otimizado pelas ações, é visto com restrições. Na abordagem cultural do institucionalismo histórico, o enfoque recai sobre a forma como os seres humanos interpretam uma situação, e como eles frequentemente recorrem para isto a parâmetros e modelos já consagrados socialmente. Nesta linha de estudo, as instituições seriam responsáveis por fornecer o conjunto de normas e regras, que condicionam a interpretação e a ação dos indivíduos. Por constituírem o arcabouço normativo que orienta a ação individual, as instituições seriam construções da coletividade, portanto, com menos propensão de mudarem de modo radical e frequente a partir de uma prática individual (HALL; TAYLOR, 2003, p. 197-199). 

 Além da forma relativamente particular com que analisam as relações entre instituições e o comportamento dos indivíduos, os adeptos do institucionalismo histórico se destacam pelo estudo da desigualdade de poder existente entre os atores no desenvolvimento e funcionamento das instituições. Para eles, a repartição do poder dentro das organizações é realizada de forma assimétrica, dando mais acesso ao processo decisório a certos grupos do que a outros (idem, p. 200). Esta diferenciação da forma como se distribui o poder em uma instituição, pode começar modestamente dentro dela, mas quando suas condições originárias são sucessivamente reforçadas, as diferenças podem se enraizar profundamente em sua estrutura. 

 Tal fenômeno pode ser analisado, por meio de uma abordagem bastante comum nos estudos de historiadores institucionais, a saber, a dependência da trajetória, ou path dependence, como é mais conhecida. Ela se refere à dinâmica de auto reforço e retornos positivos de um sistema, sua lógica compreende que diante de uma conjuntura crítica, são empregados mecanismos de feedback que acabam reforçando a repetição de um padrão específico no futuro (PIERSON; SKOCPOL, 2002, p. 699). Em outras palavras, significa que diante de uma situação desafiadora, os agentes envolvidos procuram nos modelos cognitivos e nas normas e procedimentos já estabelecidos, a forma mais adequada para enfrentá-la. Neste sentido, vale ressaltar como esta trajetória de dependência é criada. De acordo com os neoinstitucionalistas históricos ela é gerada pelas instituições, ou seja, pelos padrões institucionais construídos no passado que condicionam as ações posteriores (HALL; TAYLOR, 2003, p. 200s). 

 Apesar de enfatizar as instituições, o neoinstitucionalismo histórico não considera este o único fator a exercer alguma influência sobre os processos políticos e sociais, geralmente buscam inserir os fenômenos institucionais dentro de uma lógica de causabilidade na qual combinam as contribuições das explicações institucionalistas a outros fatores, como por exemplo, questões socioeconômicas e ideológicas que também tendem a orientar os atores envolvidos nos macroprocessos de uma sociedade (idem, p. 201s). 


  Bibliografia 

 SANDERS, Elizabeth. Historical Institutionalism. In: RHODES, BINDER, ROCKMAN. The Oxford Handbook of Political Institutions. Great Bretain: Oxford University Press, p. 39-54, 2008. 

 PIERSON Paul; SKOCPOL, Theda. Historical Institutionalism in Contemporary Political Science. In Katznelson, Ira, Milner, Helen V. (eds). Political Science: State of the Discipline. New York: W.W. Norton, p. 693-721, 2002. 

 HALL, Peter; TAYLOR, Rosemary C. R. As três versões do neoinstitucionalismo. Lua Nova. N. 58, p. 193-224, 2003.

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