Pesquise no Blog

O Ciclo das Políticas Públicas ante Modelos de Gestão Específicos


A abordagem das políticas públicas por meio de seu processo de construção e efetivação constitui uma forma de análise importante, pois a delimitação de diferentes fases proporciona a investigação “das constelações de poder, das redes políticas e sociais, e das práticas político-administrativas que se encontram em cada fase” (FREY, 2000, p. 226). A formulação de políticas públicas está diretamente ligada às demandas apresentadas pela sociedade, porém a simples existência de uma necessidade dos diversos segmentos civis e privados não implica necessariamente em uma ação de resposta por parte do poder público, ou que ela quando tomada, alcance bons resultados. A profusão de problemas sociais, econômicos e infra-estruturais existente, e a diversidade de modelos e práticas de gestão dificultam o estabelecimento de prioridades e a tomada de decisão. As demandas muitas vezes não são claras e objetivas, requerendo um processo de análise detalhado para que se chegue a uma definição acertada de que medida se deve tomar (SUBIRATS, 2007, p. 200). È importante levar em conta as diferentes variáveis que atuam sobre a questão, identificar os interesses envolvidos e quais as ações possíveis de serem adotadas. Como existem múltiplos problemas para a administração pública enfrentar, se faz necessário estabelecer sua relevância pública, de modo que sejam elencados os mais prioritários. Para que se chegue a uma agenda de trabalho, o gestor público pode estabelecer alguns indicadores que o orientarão na direção das demandas mais urgentes. Podem ser consideradas evidências de sua relevância, se a demanda representar uma crise instaurada ou passível de se agravar no futuro, caso ela sobressaia como a principal causa ou conseqüência de um problema mais amplo, quando a demanda possuir forte apelo da opinião pública e cobertura dos meios de comunicação, se suas dimensões e efeitos nocivos crescerem paulatinamente, e quando atingem a imagem do poder público (Idem, p. 205s). Há ainda demandas que são inseridas na agenda institucional sem apresentarem alguns destes elementos, mas que se tornam objeto da ação estatal por pressão de setores organizados da sociedade (sejam eles, sociais, políticos ou econômicos). Além de assimilar e reagir a demandas já existentes, a administração pública pode incorporar temas que possuem pouca ou nenhuma pressão por parte da sociedade, quando constatar que tal questão pode se agravar no futuro (Ibidem, p. 208). Posteriormente à definição das demandas são formuladas as políticas públicas que visam sua solução. Não é recomendável adotar práticas pré-formuladas sem que haja uma avaliação da conveniência e eficácia de sua aplicação, as propostas que obtiverem sucesso na dissolução de um determinado problema podem levar a resultados insatisfatórios em outros casos. Mesmo que as situações pertençam à mesma área e possuam uma conjuntura análoga, as possíveis diferenças de intensidade e incidência das variáveis sobre o problema o tornam singular, de modo que é necessário elaborar uma proposta específica e direcionada a ele. Nos modelos Burocrático e Gerencial, regularmente os principais atores envolvidos neste processo são os burocratas e os políticos, com outros personagens figurando de forma secundária. Nos governos em que a democracia participativa é aplicada, os setores mais representativos da sociedade ganham importância e exercem um importante papel na defesa de suas demandas, De acordo com Maria da Glória Gohn: “A democracia participativa demanda um tipo de participação dos indivíduos e grupos sociais em termos qualitativos e não apenas quantitativos. Para isso ela tem de alcançar segmentos diferenciados que sejam representativos tanto das carências socioeconômicas e das demandas sociais como das áreas que precisam ser conservadas para que não se deteriorem” (GOHN, 2004, p. 61). A participação destes segmentos da sociedade, se expressa neste modelo de gestão em especial por meio dos conselhos gestores e pelas iniciativas de orçamento participativo. Nos governos cuja administração possui experiências consolidadas de gestão em forma de rede esta influência também ocorre mais intensamente que no modelo burocrático e gerencial, porém a mensuração de sua efetividade é problemática, tendo em vista que, neste modelo a atuação dos agentes externos ao Estado tende a não ser formal, com baixa delegação de competências a estes atores. Ao formular uma política pública os participantes do processo precisam coletar o máximo de informações sobre o problema, analisar qual a formato de política é mais indicado, projetar os custos de sua execução e estabelecer indicadores para seu monitoramento e avaliação. Estas, entre outras tarefas, podem fazer parte de um esforço coordenado de gestão, cujas principais expressões no âmbito municipal são o Planejamento Estratégico e o Plano Diretor (ULTRAMARI & REZENDE, 2008). Ambos são formulados não apenas por técnicos da área pública, mas também podem contar com a participação dos setores da sociedade civil. O Planejamento Estratégico é mais versátil, pois não há uma determinação legal de como ele deve ser formatado, o que já não ocorre com o plano diretor que segue as diretrizes do Estatuto das Cidades. Toda a proposta de ação pública formulada para que seja efetivada deve passar pela aprovação do Legislativo e do Executivo, culminando na sua formalização em Lei. Este é um ponto crucial no ciclo de gestão de uma política pública, pois muitas ações propostas em lei não são executadas da forma como foram concebidas, como conseqüência, deixam de atingir seu objetivo (FREY, 2000, p. 228), possivelmente gerando outros problemas para o setor público e a sociedade. Algumas das causas desta dissociação entre o que foi proposto e o que é implementado, são a debilidade das instituições, o desvio de função da política, a má utilização dos recursos, serviços contratados que foram executados parcialmente ou mesmo não foram prestados. Para Eugenio Lahera Parada (2007, p. 241), a vontade política dos líderes individuais e a participação da opinião pública, são importantes para que as dificuldades na execução de uma política sejam enfrentadas e superadas. Paralelo à iniciativa governamental e civil, a implementação de uma política pública ganha maior grau de efetividade se estiver atrelada a mecanismos de avaliação. Eles podem ser realizados em função de seu “timing (antes, durante ou depois da implementação da política ou programa), da posição do avaliador em relação ao objeto avaliado (interna, externa ou semi-independente) e da natureza do objeto avaliado (contexto, insumos, processos e resultados)” (COTTA, 2001, p. 91). Em se tratando de projetos de infra-estrutura pública, a avaliação é orientada basicamente para a observação do cumprimento do cronograma e a sua análise econômica, para que se possa mensurar sua eficiência. A avaliação de programas sociais é mais complexa, pois existem inúmeros fatores que incidem sobre os critérios utilizados como variáveis no processo de avaliação, fatores que muitas vezes fogem ao conhecimento e ao domínio do avaliador (COTTA, 1998, p. 111). Quando a avaliação indica que uma política pública atingiu satisfatoriamente seu objetivo um ciclo se fecha, caso o processo de avaliação demonstre que os propósitos de uma ação não foram atingidos ou que ela produziu efeitos não desejados, pode-se dar início a um novo ciclo de políticas públicas (FREY, 2000, p. 228s). A aplicação dos modelos e das teorias de Gestão de Políticas Públicas à realidade brasileira é problemática, sendo que seus conceitos e práticas foram formulados em países mais desenvolvidos institucional e economicamente que o Brasil. Em concordância com o que afirma Frey (2000, p. 215), as particularidades das nações em desenvolvimento requerem que haja uma adaptação do conteúdo das políticas públicas aos casos específicos dos países. No caso brasileiro, uma cultura política permissiva com a corrupção, um sistema judiciário moroso, a alta fragmentação social, o déficit infra-estrutural e as históricas carências sociais, são alguns dos fatores que limitam a capacidade de aplicação direta dos mecanismos de gestão pública, e precisam ser levados em conta em qualquer análise sobre o tema. É importante que as políticas públicas no Brasil contem com um tratamento multidisciplinar e holístico, que leve em consideração as diversas variáveis que incidem sobre a questão, resultando em um desenho de política diferenciado, próprio para o enfrentamento de cada problema. Este é uma tarefa que não pode ficar a cargo apenas dos atores estatais, a sociedade civil em suas diferentes expressões também é chamada a participar. O distanciamento que muitas vezes os burocratas e políticos possuem das demandas sociais pode significar a diminuição da eficiência e da aplicabilidade das propostas. A participação dos diferentes segmentos da sociedade ligados com cada questão não é uma garantia do êxito de uma política, mas é uma possibilidade de que ela esteja em consonância com as particularidades de uma determinada demanda. A aproximação da sociedade do poder público também gera efeitos positivos sobre o ambiente político e institucional, ampliando a democracia e consolidando suas instituições.

REFERÊNCIAS

COTTA, T. C. S.. Metodologias de avaliação de programas sociais: avaliação de resultados e de impacto. Revista do Serviço Público, Ano 49, n. 2, Brasília: ENAP, p. 105-126, 1998.
COTTA, T. C. S.. Avaliação Educacional e Políticas Públicas: a Experiência do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. Revista do Serviço Público, Ano 52, n.4, Brasília: ENAP, p. 89-112, 2001.
FREY, K.. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Publicas (IPEA), Brasília, v. 21, p. 211-259, 2000.
GOHN, M. G. M. . Os Conselhos Municipais e a Gestão Urbana. In: Luiz Cesar Ribeiro; Sergio Azevedo; Orlando Alves Santos Júnior. (Org.). Governança Democrática e Poder Local: a experiência dos conselhos municipais no Brasil. 1a ed. Rio de Janeiro: REVAN/FASE, v. 1, p. 57-93, 2004.
MASSARDIER, G.. Redes de Política Pública. In: Políticas Públicas (Col.). Brasília: ENAP, v. 2, p. 161-186, 2007.
PARADA, Eugenio Lahera. Implementación de las Políticas y Asesoría Presidencial. In: Políticas Públicas (Col.). Brasília: ENAP, v. 2, p. 239-261, 2007.
SUBIRATS, Joan. Definición del problema. Relevancia pública y formación de la agenda de actuación de los poderes públicos. In: Políticas Públicas (Col.). Brasília: ENAP, v. 1, p. 199-218, 2007.
ULTRAMARI, C.; REZENDE, D. A.. Planejamento Estratégico e Planos Diretores Municipais: referenciais e bases de aplicação. RAC. Revista de Administração Contemporânea, v. 12, p. 717-739, 2008.

Nenhum comentário: