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Comentários Sobre Resultados Eleitorais no Paraná entre 1992 e 2004

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DO VOTO NAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS PARANANESES ( 1992 - 2004 ) As eleições de 1992 no Paraná tiveram um cenário de disputa partidária mais heterogêneo que a anterior, catorze partidos elegeram representantes para o comando do executivo de algum município. Nesta oportunidade o grande vencedor foi o PMDB, elegendo 138 prefeitos, seguido pelo PP (62), PDT (40) e pelo PFL (39). Considerando a votação obtida, podemos concluir que o PMDB se mostrava um partido mais institucionalizado que os demais. Mesmo elegendo um número de candidatos bem maior que as outras legendas, a variação nas votações obtidas por seus representantes foi menor que o verificado no PDS e no PTB. Três fatores contribuíram para essa diferença, a existência de candidatos personalistas nestas duas legendas e a capilaridade da estrutura partidária do PMDB no Estado e o fato deste partido ser o mesmo do Governador do Estado, na ocasião Roberto Requião. A disputa eleitoral em 1996 foi menos acirrada, com um número menor de partidos elegendo prefeitos. Mas a diferença mais clara em relação à eleição anterior se dá no número de candidatos que cada partido elege. O PMDB que havia sido o maior agraciado com o voto do eleitorado em 1992, fica na segunda colocação em 96 com 74 prefeitos eleitos. Isto ocorre devido ao ótimo desempenho do PDT que elegeu 111 prefeitos, impulsionado, como o PMDB na eleição anterior, pelo comando do executivo estadual, que naquele momento estava sob a responsabilidade de Jaime Lerner, líder do PDT no estado. Em 2000 temos uma nova configuração na distribuição do voto, o PSDB que nas eleições anteriores vinha crescendo progressivamente no estado (14 prefeituras em 1992 e 73 em 96), sai desta eleição com o maior número de prefeitos eleitos, 96 no total. Diferente de PMDB e PDT que em 92 e 96 contavam com o apoio do governo do estado, o PSDB de 2000 era oposição ao Governador Reeleito Jaime Lerner, que havia se transferido para o PFL, partido que ficou em segundo lugar no número de prefeitos eleitos, 85 ao todo. Nesta eleição como nas anteriores, verifica-se que alguns partidos possuem uma tendência ao personalismo, devido à grande variabilidade nos votos obtidos por seus prefeitos eleitos, este é o caso do PTB e do PFL. Esta tendência se confirma na eleição de 2002, mesmo que a grande variabilidade na votação dos eleitos neste momento não tenha sido verificada apenas nestes dois partidos, com o PP, o PDT, e mesmo o PT e o PSDB tendo uma grande variação na votação obtida por seus candidatos. Nesta eleição o PMDB volta a figurar como o partido que elegeu mais prefeitos, 119 no total, mais que o dobro do PSDB, segundo colocado com 50 prefeituras. Os fatores que contribuíram para esse sucesso foram praticamente os mesmo de 1992, uma estrutura partidária bem capilarizada no estado e o apoio do governo estadual, novamente a cargo de Roberto Requião.Analisando os dados das eleições selecionadas ainda podemos tecer mais alguns comentários. No Paraná os adversários mais ferrenhos são o PMDB e o PSDB, nas ultimas três eleições dos dois partidos sempre estiveram entre os três que mais elegeram prefeitos. O PTB e o PP (PPB) são partidos que sempre obtém um resultado mediano, o que demonstra que estes partidos possuem uma estrutura partidária bem organizada no estado. Vemos ainda que o PT foi a legenda que mais cresceu proporcionalmente, passando progressivamente de um prefeito eleito em 1992 para 29 em 2002, apesar de ser pouco institucionalizado no estado. A baixa institucionalização também se verifica no PFL, que em outros estados é uma das principais forças, mas no Paraná não consegue um resultado expressivo sem que fatores conjunturais lhe auxiliem, caso do governo Jaime Lerner em 2000 que contribuiu para o partido ser o segundo mais votado.
DISTRIBUIÇÃO DO VOTO DA CANDIDATURA DE LUÍS INÁCIO LULA DA SILVA À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA NO PARANÁ EM 1998 E 2002 Em 1998, Luis Inácio Lula da Silva (PT), disputava sua terceira eleição para a presidência do Brasil. Concorria com outros candidatos ao cargo, além de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que naquela circunstância era o chefe do executivo federal. Sua candidatura não logrou êxito, sendo derrotado em primeiro turno pelo candidato tucano. Podemos ter uma perspectiva de como foi esta disputa, analisando a eleição no estado do Paraná. Dos 399 municípios paranaenses, FHC alcançou a vitória em 354 e Lula em apenas 45. Nas cidades em que foi majoritário, Lula teve uma média de 40% dos votos contra 50% de FHC naquelas em que saiu vitorioso. Um dado peculiar da votação do candidato do PT neste pleito é que, a imensa maioria das cidades onde obteve mais votos que seu adversário direto se localiza na região sudoeste do estado. Isto pode ser explicado pela colonização daquela região, onde sua população é composta em grande parte por migrações vindas do Rio Grande do Sul, um estado de tradições mais progressistas que o Paraná, cuja cultura política é mais conservadora. Esta tendência histórica do eleitorado paranaense é contrariada na eleição de 2002, em que Lula alcança a vitória na maioria dos Municípios do estado. Nesta eleição o candidato do PT teve uma votação mais ampla que em 1998, desta vez, os votos em Lula não se concentraram na região sudoeste e se dispersaram por todo o estado. No primeiro turno, ele contou com a preferência do eleitorado de 308 municípios, José Serra (PSDB) seu principal adversário nesta disputa, teve o maior número de votos em 89 das cidades paranaenses, e Anthony Garotinho (PSB) que corria por fora na corrida pela presidência, foi vitorioso em apenas duas cidades. A vitória de Lula se confirmaria no segundo turno, mas por uma margem menor. Serra viu seu desempenho melhorar e conquistou o maior número de votos em 139 municípios, mesmo assim não suplantou Lula que foi o preferido do eleitorado em 260 localidades. Consagrando-se o candidato majoritário no estado, e também nas demais unidades da federação brasileira, Lula se tornou o presidente do país.Esta mudança na decisão do voto do eleitor paranaense na eleição de 2002 em relação à anterior se deve principalmente, ao descontentamento do eleitorado com a gestão de FHC, em particular de seu segundo mandato. Como Serra pertencia ao mesmo partido, o eleitor repudiou a continuidade tucana na condução do país. Outro fator que contribuiu para o êxito de Lula nesta eleição é a mudança de perfil do partido. O PT que sempre havia se notabilizado como um partido notadamente de esquerda, havia dado uma guinada para o centro do espectro ideológico progressista-conservador. Abrindo mão de convicções e propostas históricas, para proclamar um discurso mais ameno e firmar alianças mais amplas, o PT deixou de ser caracterizado como um partido de radicais e passou a ser identificado por seus adversários com jargões sugestivos tais como, “PT cor-de-rosa” e “Lulinha paz-e-amor”. Desfazendo o receio que grande parte do eleitorado tinha do partido e de suas ações ao assumir o poder.

Preferências Eleitorais nas Eleições Municipais Paranaenses: 1963 a 1988

PREFERÊNCIA EM ELEIÇÕES MUNICIPAIS NO PARANÁ POR PARTIDO POLÍTICO (1963 – 1972) O cenário eleitoral paranaense demonstra uma relativa alteração de tempos em tempos, não apresentando um quadro consolidado por muitas eleições sucessivas. Esta observação pode ser verificada nas eleições municipais ocorridas entre os anos de 1963 e 1972. Nas eleições de 1963 e 1965 o quadro partidário é diverso, com um número razoável de partidos (9 e 7 respectivamente) disputando as eleições. Já nas eleições municipais de 1968 e 1972 o cenário é bastante diferente, com apenas dois partidos, ARENA e MDB disputando a preferência do eleitorado. Esta diferença é resultado direto dos fatos políticos, institucionais, sociais e econômicos que formavam o contexto da época. Em particular o Golpe Militar de 31 de Março de 1964 que, depôs o Presidente João Goulart e conduziu o General Castelo Branco ao cargo de Presidente da República, que entre outras medidas, cassa o mandato político de opositores do regime, institui o bipartidarismo (1965) e impõe uma nova Constituição (1967). O Golpe não ocorreu por uma mobilização apenas das forças armadas, mas também por um posicionamento ideológico conservador de boa parte da classe política e da sociedade brasileira, no Paraná esta posição era ainda mais acentuada. Nas eleições municipais de 1963, por exemplo, nenhum partido ‘de esquerda’ conseguiu uma votação considerável. O eleitorado dividiu sua preferência entre partidos de centro como o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e os partidos de direta como o Partido Trabalhista Nacional (PTN), o Partido Democrático Cristão (PDC), o Partido Social Democrático (PSD) e a União Democrática Nacional (UDN). Nesta eleição como na de 1965, os partidos de direita foram os grandes vitoriosos, elegendo a maioria dos prefeitos municipais, com destaque para o PSD que em ambas foi o partido que mais elegeu representantes. Apesar desta superioridade, os partidos de direita na eleição de 1963 não dominavam com uma ampla margem de diferença a disputa política, o PTB teve expressiva votação nesta eleição. Esta frágil correlação de forças se tornou desproporcional na eleição de 1965, já sob o regime militar, onde os partidos de direita elegeram muito mais prefeitos que os de centro. Esta tendência do eleitorado se tornou mais evidente nas duas eleições seguintes. Instaurado o bipartidarismo, o sucesso conservador se manteve. A ARENA nas eleições de 1968 e 72, apesar de ter uma margem não muito superior à do MDB na porcentagem dos votos, elegeu muitos mais representantes para as prefeituras municipais, em números absolutos. Isto ocorreu porque, a votação do partido que apoiava o regime militar (ARENA) foi bem maior do que o de oposição (MDB) nas cidades médias e pequenas, situadas nas regiões interioranas. O MDB, apesar de ter uma diferença menor de votos em relação à ARENA na Região Metropolitana de Curitiba, também não a suplantava nesta região em número de prefeitos eleitos. Esta disposição de forças foi praticamente igual nestas duas eleições, mas viria a se alterar nas eleições futuras (principalmente na década de 1980) a favor do MDB, corroborando a tese do dinamismo no cenário eleitoral paranaense. PREFERÊNCIA DO ELEITORADO NAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS (1968 E 1976) POR REGIÕES NO PARANÁ Ao analisarmos os dados das eleições municipais de 1968 e 1976 por regiões, veremos que sua distribuição em pouco se difere das observações feitas a partir da distribuição por partidos. A vantagem da ARENA em relação ao MDB fica evidente, em todas as regiões paranaenses. Na Região Metropolitana de Curitiba, a porcentagem de votos entre os dois partidos em 1968, a diferença é pequena, com uma certa superioridade da ARENA em relação ao MDB. Esta diferença é maior na eleição de 1976, em que o partido da oposição teve um desempenho bem abaixo do da situação. As maiores diferenças entre os dois partidos, se deu nas regiões metropolitanas norte e oeste, em que o volume de votos conservadores foi muito maior que o recebido pelo MDB. Em geral a disposição de forças se repete nas regiões Norte, Oeste, Cento e Sul do Estado, nas eleições de 1968 e 1976, os percentuais da ARENA por região são praticamente sempre superiores aos do MDB, em qualquer região agrupada, em ambas as eleições. Isto dava à ARENA o domínio dos Executivos Municipais no Paraná, fato que colaborava com a manutenção do regime militar, e decorria em grande parte de sua própria ação. Os militares tinham interesse no sucesso eleitoral de sua base de apoio político. Controlando o aparato estatal, o regime militar detinha os mecanismos institucionais, para favorecer eleitoralmente seus colaboradores. Por meio de repasse de verbas, apoio logístico, entre outros recursos, os militares favoreciam os candidatos da ARENA, que naquele momento contavam ainda com a aceitação de uma parcela significativa da sociedade paranaense, tais elementos resultaram no sucesso eleitoral deste partido nas eleições em questão.
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DO VOTO NAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS PARANANESES (1982 -1988) As eleições municipais de 1982 ocorreram durante o mandato do Presidente da República, General João Batista Figueiredo, último representante do regime militar. Apesar do bipartidarismo iniciado em 1965 ter se encerrado em 1979, apenas dois partidos protagonizaram a disputa eleitoral no Paraná em 1982, elegendo representantes para os executivos municipais. Ambos derivados dos partidos do período bipartidário, o PMDB originado do MDB que fazia ‘oposição’ ao regime militar, e o PDS proveniente da ARENA que oferecia apoio parlamentar aos militares. O PMDB naquele pleito conseguiu eleger um número maior de prefeitos que o PDS, 170 contra 126. A amplitude da votação recebida pelos prefeitos de cada partido nos mostra uma diferença entre eles. O PMDB apesar de eleger um número maior de representantes teve uma variação menor, com candidatos sendo eleitos com um índice que variou de 18% a 57% dos votos de seus municípios. Demonstrando maior consistência na votação do partido, com um peso maior da sigla em comparação com o da pessoa dos candidatos. O PDS por sua vez, com seus 126 prefeitos eleitos, teve uma variação percentual entre 19% e 78%, o que pode ser explicado por candidaturas personalistas que obtiveram um índice elevado de votos em seus municípios. Isto também pode ser observado pela média de votos[1] dos prefeitos eleitos por este partido, 40% contra 35% do PMDB. Ao analisarmos esta eleição por meio de regiões agrupadas (Regiões divididas em: Metropolitana e Litoral, Norte, Oeste, Centro e Sul), constatamos que a superioridade do PMDB sobre o PDS ocorreu em todas elas, principalmente na região Oeste onde o PMDB elegeu quase o triplo de prefeitos que o PDS (46 x 17), nas demais regiões o resultado foi mais equilibrado. Nesta forma de análise também verificamos o que pudemos observar anteriormente, o PDS obtendo maiores variações na votação de seus candidatos que o PMDB. A exceção fica por conta da região Oeste onde o PDS teve uma amplitude de votos que variou 27 pontos percentuais e o PMDB uma variação de 37 pontos. Contudo, se tomarmos como referência o tamanho dos municípios, veremos que o perfil personalista da votação do PDS se confirma. Verificamos que quanto maior o município a dispersão dos votos foi menor, nas cidades de porte médio a variação entre os candidatos com maior e menor votação é menor que nos micro e pequenos municípios. É nestes últimos onde se encontra o filão do PDS, somente nos menores municípios o partido consegui eleger um número maior de prefeitos que o PMDB (75 x 68). A média de votos recebida pelos candidatos do PDS nos micro municípios foi de 47%, demonstrando a alta concentração de votos destes candidatos, confirmando o perfil personalista destas votações. Em 1985 tivemos a primeira eleição direta para prefeitos em municípios considerados de ‘segurança nacional’, onde os ocupantes do executivo eram indicados pelo governador. Os eleitores da Capital Curitiba e de mais 12 cidades do estado (a maioria na região oeste, devido à fronteira com Paraguai e Argentina) foram às urnas e confirmaram o PMDB como o preferido entre os demais partidos. A legenda conseguiu eleger seus candidatos em todos os 13 municípios que realizaram eleições naquele ano. Já a eleição municipal de 1988 teve um cenário diferente das anteriores, um número maior de partidos concorreu e conseguiu eleger seus candidatos, 318 prefeitos foram escolhidos por um eleitorado que demonstrou uma posição partidária de centro com uma inclinação para a esquerda, contrariando o voto conservador tradicional dos eleitores do estado.Considerando que os dois partidos com maior número de prefeitos eleitos, PMDB (159 ) e PTB[2] (65), se posicionam ao centro da dicotomia política-ideológica entre direita e esquerda. A esquerda que no passado nunca havia tido algum sucesso no estado, obteve uma votação respeitável o PT conseguiu eleger dois candidatos e o PDT 25, dando a este partido o quarto lugar na votação geral. Os partidos de direta PFL, PL, PDS e PDC tiveram sua importância política reduzida, em virtude do baixo número de prefeitos eleitos (67) que, como vimos anteriormente, tendem a serem de municípios de pequeno porte. Dentre eles o mais prejudicado foi o PDS, em 1982 a sigla havia elegido 126 prefeitos, em 1988 viu este número se reduzir a 13 prefeituras. Nesta eleição podemos observar que a tendência personalista, demonstrada pela diferença dos votos recebidos pelos prefeitos com menor e maior votação, não se restringiu a partidos conservadores como o PDS e o PFL. Partidos de centro e até mesmo de esquerda demonstraram contar com políticos personalistas em suas fileiras. O PMDB teve uma média de votos de 48% nos municípios onde conseguiu eleger seus candidatos, o PDT teve uma média de 45% com seu candidato mais votado obtendo a preferência de 69% do eleitorado do município. Mas o campeão neste quesito seria o PTB, que com 50%, teve a maior média de votação e também o candidato que obteve mais votos individualmente, atingindo aproximadamente 74% de votos em determinado município.
[1] Quanto mais elevada for a média geral de votos de um partido nas eleições municipais, mais candidatos com perfil personalista ele tende a possuir. Estes candidatos se destacam por obterem votações expressivas, o que eleva a média da votação obtida pelo partido. [2] O PTB atualmente pode ser considerado como uma legenda de centro-direita, em virtude da composição de seus quadros, da atuação parlamentar no Congresso Federal, entre outros aspectos.

Resenha: "Um Inimigo do Povo" de Henrik Ibsen.

O drama transcorre em uma pequena cidade do litoral meridional da Noruega, o personagem central é o Dr. Thomas Stockmann. A princípio o imaginamos como um pacato médico do interior, mas já nas primeiras páginas constata-se que ele é um indivíduo ativo, resoluto e participante das questões mais importantes de sua sociedade. Isto decorre em parte de seu ofício, mas também por ser ele um funcionário público e o irmão do prefeito.
Apesar de possuir uma condição social estável, ele não estava tranqüilo, já há algum tempo, tinha constatado que os banhistas e turistas que freqüentavam a estação balneária da cidade estavam contraindo com freqüência tifo e febres gástricas. Suspeitou de que a água estava contaminada, pelos curtumes que ficavam rio adentro. Para não causar alarde, ele recolhe em segredo amostras da água e envia para uma universidade para que sejam feitas análises. Quando o resultado chega suas dúvidas se dissipam, estava comprovado que a água estava contaminada com detritos de animais decompostos. A questão passa a ser então, como iria proceder de posse dessa informação tão relevante.
Ele decide publicar um artigo denunciando a situação, a publicação seria através do jornal “A Voz do Povo” de propriedade de um amigo, o Sr. Hovstad. Esta decisão trazia junto de si inúmeras implicações. Primeiro ele estaria se indispondo com seu irmão, o Prefeito, porque tal notícia o prejudicaria politicamente, tendo em vista que o balneário era administrado pela prefeitura. Ele também enfrentaria a oposição dos donos de curtume, dentre os quais estava seu sogro, Morten Kill, além é claro, de todos aqueles que de alguma forma fizeram algum investimento na Estação Balneária, e que teriam seus negócios prejudicados. Mas Dr. Stockmann prefere enfrentar todos estes interesses particulares, a permitir que as pessoas em geral continuassem sendo expostas a esta contaminação.
Para isso ele contava com o apoio inflamado do Sr. Hovstad, e também de Billing (subeditor do jornal) e de Aslaksen (impressor do jornal e presidente da associação dos pequenos proprietários). Estes, quando ficaram sabendo da contaminação das águas, prontamente ofereceram apoio ao Dr. Stockmann, e garantiram que também a maioria da população o apoiaria na campanha para reverter este problema. O doutor estava decidido a enfrentar as autoridades e os demais detentores do poder local, para defender os interesses que ele considerava ser da maioria das pessoas, atitude que o entusiasmava. Contudo, as coisas não acontecem da forma como ele previa.
Quando a publicação da denúncia do Dr. Stockmann no jornal “A Voz do Povo” era iminente, o prefeito em uma visita à redação do jornal toma conhecimento do artigo escrito por seu irmão. Ele fica consternado e procura dissuadir Hovstad de que a publicação da denúncia não seria benéfica para o jornal. O prefeito alega que tal informação se veiculada, traria inúmeros prejuízos financeiros para a comunidade, os turistas se afastariam da Estação Balneária, os investidores, principalmente os menores, perderiam todo o seu dinheiro aplicado, e por fim, os assinantes do jornal o boicotariam, a partir do momento que identificassem o jornal como o veículo de tamanho prejuízo.
Diante destas alegações, Hovstad desiste de publicar o artigo do Dr. Stockmann. O impressor Aslaksen que também presenciava as ponderações do prefeito segue o mesmo caminho, principalmente quando é informado que os pequenos proprietários perderiam muito com o embargo à Estação Balneária, e por fim Billing também volta atrás. Nenhum deles estava disposto a ir contra a ordem estabelecida, principalmente quando se deram conta de que seriam prejudicados de alguma forma. O bem comum neste caso, passa a ser secundário diante dos prejuízos particulares que cada um sofreria.
Dr. Stockmann quando fica sabendo da mudança de posição de seus antigos defensores, decide levar adiante suas denúncias, contando basicamente com o apoio de sua mulher e filhos. Por manter-se irredutível no compromisso de levar a público o que havia descoberto, ele é demitido do posto de médico da Estação Balneária e desvinculado do serviço público, ou seja, acaba perdendo toda a sua fonte de renda. Ele procura um lugar para que seja realizada uma audiência pública, onde exporia a gravidade da contaminação das águas e assim buscaria o apoio da população. Porém, Dr. Stockmann não consegue nenhum espaço público para realizar sua audiência, pois  seu irmão publica um artigo em “A Voz do Povo”, fazendo menção ao problema da contaminação do rio, sem evidentemente expor os resultados das análises obtidas pelo doutor; e se referindo ainda, a eventuais obras e aos custos que elas teriam para as contas do município, já influenciando assim, a opinião dos cidadãos.
Depois de muito procurar um lugar para a audiência, um amigo, Sr. Hoster, cede sua casa para que seja feita a reunião. No dia em que ela ocorre, comparecem várias pessoas, cidadãos comuns, pequenos proprietários, e todos aqueles que de alguma forma teriam interesse sobre a questão. Esta era a ultima chance do doutor reverter a situação, mas o que era para ser uma audiência em que ele procuraria expor sua denúncia, se transforma em um debate. O que não poderia ser pior para ele, pois, por mais que estivesse defendendo uma verdade que traria benefícos para a comunidade, ele estava sozinho diante de vários opositores, e fazer a opinião da população virar a seu favor, não seria tarefa fácil.
Na medida em que o assunto vai sendo discutido, Dr. Stockmann vai ficando mais acuado e também mais nervoso. O apoio das pessoas ali presentes se torna praticamente inviável, quando o prefeito alega que, para que a prefeitura faça as obras necessárias para sanar o problema da contaminação das águas, a Estação Balneária ficaria paralisada por pelo menos dois anos, e que não tendo recursos para as obras, haveria um aumento de impostos para financiar as reformas. Diante da evidência de que não conseguiria o apoio dos cidadãos para sua empreitada, Dr. Stockmann passa do nervosismo para a calma, e muda de estratégia. Ao invés de insistir na questão das águas, ele passa a atacar a idéia de que a maioria seria detentora da verdade, sendo que agora, ele se considerava o único defensor da verdade.
No decorrer de sua argumentação, ele critica indiretamente os presentes, mas estes percebem a conotação de suas palavras e passam a vaiá-lo. Quando insiste em levar a público sua denúncia, mesmo diante da posição contrária de praticamente todos os presentes, e tendo que para isso seja necessário procurar jornais de outras localidades, as pessoas se revoltam contra ele e passam a chamá-lo de “inimigo do povo” e “traidor da pátria”, daí em diante a seção é tumultuada e termina com a cassação do direto de palavra do Dr. Stockmann.
As conseqüências de sua iniciativa, são duras para ele e sua família. Na mesma noite da audiência, sua casa tem as janelas apedrejadas, sendo ainda despejado dela, tendo em vista o temor do proprietário de eventuais represálias. Sua filha é demitida do cargo de professora pública, eles enfrentam dificuldades até mesmo para comprar alimento e seus filhos são expostos a provocações e atritos na escola. Eles então conseguem abrigo na casa daquele que parece ser o único a auxiliá-los, Sr. Hoster.
Mas inclusive ele sofrera sanção por ter cedido sua casa para a audiência chamada pelo doutor, tendo sido demitido do posto de comandante de embarcações, pelo proprietário destas e que também era acionista da Estação Balneária. Apesar de todas as pressões e da possibilidade de mudar-se, Stockmann decide permanecer no município. Convicto de que fizera a coisa certa, estava com a consciência tranqüila, e mesmo com as dificuldades, poderia continuar a viver na sua terra natal.

Apesar de se tratar de uma ficção, esta peça teatral demonstra as dificuldades que podem ser enfrentadas quando se almeja o bem comum. Mas uma questão se impõe, quem detém o monopólio dos interesses da coletividade? Um setor organizado da sociedade, os governantes, a grande massa da população, um indivíduo isolado? Nenhum destes podem ser considerados defensores exclusivos do interesse geral, porque este se refere a toda sociedade, e todos os seus integrantes detém em maior ou menor grau, direito de influir no processo decisório.
Teoricamente, aquele ou aqueles que defendessem uma verdade incontestável, como era o caso do Dr. Stockmann sobre a contaminação das águas, haveria de contar com o apoio da maioria. Mas, como Ibsen demonstra, e como é possível constatar ao longo da história, nem sempre a verdade e o bem geral triunfam diante de interesses particulares. Isto se deve em grande parte à dinâmica da opinião pública, que por sua heterogeneidade não possui muitas convicções pré-estabelecidas, sendo passível de manipulação por aqueles que possuem instrumentos para isso. É o que ocorre nessa obra de Ibsen, os líderes do poder público, da imprensa e das associações, por mais que representassem parcelas importantes da população, se preocuparam mais com as perdas econômicas e políticas ocasionadas pela notícia da contaminação, do que com os reflexos prejudiciais que ela traria às pessoas em geral.
E para garantir o apoio da maioria dos cidadãos, utilizaram-se de suas posições e dos recursos que detinham de forma vil, procuraram esconder a verdade tirando o foco da questão das águas e denegrindo a conduta do Dr. Stockmann, ludibriando a sociedade. Também chantagearam e adotaram represálias contra o doutor e quem quer que lhe prestasse apoio, visando desarticular qualquer forma de oposição a seus interesses. Este tipo de conduta é exatamente o contrário daquilo que se espera de pessoas que ocupam cargos público, que precisam buscar respostas eficientes às demandas da sociedade, e também da mídia, da qual se espera que  um retrato transparante da realidade e o zelo para que a verdade e o bem comum prevaleçam.
A população também possui responsabilidade diante de tais circunstâncias, pois é como um dever de todos, auxiliar na fiscalização das questões públicas, todavia o individualismo muitas vezes suprime esta visão de conjunto nas pessoas, tornando a gestão dos recursos e do aparato público, objeto da competência de poucos indivíduos, o que contribui em muito para que estes façam do Estado uma fonte de benefício próprio. Outra questão em evidência na obra de Ibsen é a postura que se deve ter diante de um processo democrático. Pode-se verificar que Dr. Stockmann não consegue atingir seu objetivo porque encontrou uma forte oposição. Mas sua atitude teria influído sobre o desenrolar dos fatos? Certamente que sim.
O autor em diversos momentos descreve seu comportamento, e o retrato que temos do doutor é o de uma pessoa inquieta, sempre andando de um lado para o outro, esfregando as mãos, de temperamento forte e imprevisível, que em várias ocasiões exaltava-se, seja para a alegria como para a ira. Desde o início ele já estava preparado para defender sua posição, tanto que já tinha elaborado um artigo denunciando a contaminação, mesmo sem ter a certeza de que ela realmente ocorrera. Quando ficou comprovado que o rio estava contaminado, ele optou primeiramente pela denúncia, e sustentou esta posição, mesmo quando seus aliados de primeira hora o abandonaram, insistiu por esse e caminho acabou isolado, prejudicado e sem conseguir reverter a situação.
Creio que o autor procura evidenciar assim, que é preferível o debate, o diálogo, uma saída negociada, a optar pela polarização das opiniões, pela defesa radical de algum ideal, mesmo que este se baseie na verdade científica. Ou seja, o processo decisório democrático é indeterminado, não se baseia somente no que pode ser considerado uma verdade irrefutável, se assenta também, e com mais freqüência, na imprevisibilidade das opiniões pessoais e dos fatos cotidianos. Neste sentido, pode-se concluir que as questões democráticas, além de priorizarem a vontade da maioria e se basear na verdade dos fatos, requerem também uma grande medida de bom senso e temperança, em particular naquelas questões em que a complexidade política, valorativa ou socioeconômica são maiores.

Henrik Johan Ibsen (1828 – 1906), dramaturgo norueguês e um dos principais expoentes do teatro realista moderno.

Bibliografia 
IBSEN, Henrik, Um Inimigo do Povo. L&PM, Porto Alegre, 2003.